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A CARTA


Publicado em: 25/02/2015 - 11:02:48
Fonte: Sandra Campos/A Tribuna MT


Por dois anos seguidos a escola do meu filho mandou a seguinte pergunta: O que é ser mãe? As diversas opiniões eram fixadas no mural destinado às homenagens, durante o mês de maio. Aquela pergunta me fazia pensar numa questão essencial que precede a condição de mãe: O que é ter mãe? Antes de ser mãe, sou filha, devo a minha mãe parte do que hoje sou. Carrego sua herança genética, os anos de convívio e aprendizado ao seu lado, alguns defeitos e habilidades, a sensibilidade sutil de quem percebe o não dito, de quem a todo tempo lê o mundo e o que há em suas entrelinhas.

Oh minha mãe! Quantas vezes na pré-adolescência não entendi a sua inquietação? Mas saiba que foi ela que um dia me fez escrever aquela carta de desabafo, cheia de porquês, por querer entender as mazelas da vida. Te chamei, no sossego do cair da noite, e sentadas no batente da porta de entrada de nossa casa, pedi que lesse em voz alta. Surpresa, abriu a carta lentamente. Era a primeira vez que havia lhe confrontado daquela maneira. Comovida, chorou ao meu lado, o choro de quem errava sem saber. Me pediu perdão e eu a perdoei. Oh minha mãe! Aquela carta nos ligou ainda mais, num amor sem fronteiras nem cerimônias, e hoje posso lhe expressar os sentimentos que há em mim e compreender seu amor incondicional, até em seus gestos.

O meu aniversário se aproxima, mas o presente é pra você. Por ter me gerado, me amado, me educado. E lhe digo: sem saber me presenteou com uma educação libertadora, aquela ensinada por Paulo Freire: crítica, humanista, conscientizadora. Se tivesse feito de mim uma vasilha, um mero recipiente neste mundo, seria um depósito de tantas vozes, e não estaria escrevendo agora. Você me deu asas, minha mãe, grandes e lindas!

Sempre me lembrarei de como foi sofrida sua gestação e de que em sangue me concebeu. Nunca me esquecerei de que Deus, em sua infinita bondade e misericórdia, não a deixou morrer. De que todos os anos, no dia do meu aniversário, você me dizia e ainda me diz: vivi para te criar. Em lágrimas escrevo, para registrar minha gratidão a Deus e a você, minha mãe Celina. Posso até chorar, pois a saudade é grande, mas sei que a alegria vem pela manhã, trazendo notícias suas. De sua vivacidade na melhor idade, sua disposição, sua fé, seu amor abnegado, sua independência e sua força, que não fugiu com o avançar dos anos.

Lembro dos poucos momentos de distração que tinha comigo, quando criança, de que gostava de me fotografar, de me colocar sentada no murinho de casa e ali me ensinar a contemplar a lua e cantar pra mim: “Lua, luazinha, me dê pão com farinha, para dar a minha gatinha que está presa na cozinha, com fome, coitadinha, miaaaau” . Lembro dos contos de fada que lia e de que, ao ouvi-los, reinventava as estórias em minha imaginação.  Sinto saudades. Mas das surras, nunca sentirei saudades! Quando descobria que iria sobrar pra mim, abria as asas de águia e voava bem rápido para o alto da goiabeira, no quintal da casa de minha avó, que ficava ao lado de nossa casa. Esperava a poeira baixar para voar em retorno. Tenho saudades dos pés de goiaba, pois além de me alimentarem, eram refúgio. Para lá fugia das angústias e desesperos desta vida, da tristeza e da dor que eu sentia, assim como tantas pessoas sentem neste país, por não terem suas necessidades básicas devidamente atendidas.

Não chore de saudades minhas, pois logo quero te encontrar e dançar com você na sala de estar, arrancar seus sorrisos guardados e juntas rirmos o riso despretensioso do nosso amor. Não chore, que quero ir logo, te encher de beijos no pescoço e atendendo a seu pedido, me deitar em seu colo e sentir seu afago, minha mãe, minha querida mãe. Devo lhe dizer que a reconstrução da casa que realizei aos 21 anos, junto com minha irmã Aracele, a casa em que você até hoje mora, não foi apenas a realização de um sonho de criança, foi um presente para simbolizar e, de certa forma, retribuir o seu amor. Para lhe coroar com as honras que a vida não lhe deu, mas que merece, por tudo o que sofreu, por tudo o que a vida lhe roubou, sem que eu tenha ouvido uma só reclamação ou lamúria sua. Você é um exemplo, forte guerreira! Mando beijos e um até breve.

Parafraseando Ivone Boechat, ter mãe é ter ternura guardada, na alegria ou na dor. É ter certeza de amparo, de socorro, de favor, silenciosamente confiável. E digo: ter mãe é ter a oportunidade de aprender a ser MÃE, com todas as letras. Com as três letras que levou Mário Quintana a escrever que mãe é palavra tão pequena, do tamanho do CÉU e apenas menor do que DEUS.

Como escreveu Fernando Pessoa, “tudo vale a pena se a alma não é pequena.” Assim, o desabafo no tempo oportuno pode resignificar o relacionamento entre mãe e filha. O melhor diálogo ainda é aquele olho no olho, mas quando não for possível, outros recursos podem ser acionados como ponto de partida. Hoje, diferente do meu tempo de adolescente, temos o e-mail, as redes sociais e outros mais. Seja qual for o meio usado, sempre será válido se unir pessoas pelo amor e perdão.




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