Foi durante uma das famosas reuniões de amigos no Buteco do Jisus, em Botafogo, um bar que não existe mais e que ficava no Rio de Janeiro Sem Guerras – uma cidade que também já não existe. Lá para as tantas, o papo desandou para o lado das quatro estações. Pedro Garganta puxou a conversa:
– A mim agrada, por demais (sacaram o estilo?!), o clima outonal. O frescor das folhas, o sol ameno, os dias são mais radiantes.
Rocha, conhecido nas mesas e arredores como “o Cacique da Bambina”, completou:
– A cerveja fica mais gelada. As mulheres são mais cheirosas e mais macias.
Foi solicitada a opinião de uma representante do grupo feminino:
– Prefiro o verão – disse Nina.
– Aumenta o calor na formosinha, né, preta? – bombardeou o intrépido Yonzinho Cantareira, que todas as noites atravessava a Baía de Guanabara para beber em Botafogo, e arrastava uma asa bastante caída para o lado da amiga.
Gargalhadas. Beijinho de reencontro nos copos. Mordidinhas na moela. Bilau Baixinho, que pecava pelo apelido e hoje seria chamado de “verticalmente prejudicado”, retomou o fio da meada:
– Sou mais o inverno. Ventinho frio, roupinhas quentes. O inverno tenciona os músculos e enrijece os doces lábios.
Nina engasgou com uma rodela de salaminho. Yonzinho partiu em socorro:
– Mastiga devagar, boneca. O salame é um tira-gosto roliço e traiçoeiro.
Era assim que a banda tocava. Havia poesia em tudo.
Rocha da Bambina interrompeu a conversa, levantando-se de braços abertos:
– Oi! Chega até aqui! – gritou, na direção de uma linda mulher que se aproximava.
– Vem cá, prima. Vem conhecer os meus amigos!
E puxando a cadeira para a visitante:
– Pessoal, esta aqui é minha prima Vera.
Primavera! Era a estação que estava faltando.
Garganta deu a volta em torno da mesa e se aproximou, derretido.
– Conheço você, não sei de onde.
– Conhece Juiz de Fora? Sou de lá.
– Claro – disse Pedro, os braços de polvo varrendo copos e os ombros da moça. – Vou a Juiz de Fora pelo menos uma vez por mês. Fico no Plazza. Você mora onde?
– Moro na pensão de Dona Fulô.
O clima pesou um pouco. Mas Garganta não perdeu a viagem:
– Sou representante de uma empresa de tubos e conexões, por isto viajo muito. E você, Vera, mexe com o quê?
O humor presente em carne e osso, muito mais carne do que osso. Vera não perdia a timidez nem a inocência primaveril:
– Mexo com os quadris.
Resolveram comentar os programas eleitorais. Bobagem ficar perdendo tempo com as estações do ano.